segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O significado da palavra "NÃO" em termos caninos

Hoje vamos falar de um assunto que a meu ver tem muito interesse..
Muitos donos de cães têm grande resistência em mudar o hábito de dizer (gritar) continuamente a palavra "NÃO" quando os seus cães fazem (ou fizeram) asneiras.
Mas porque é que haviam de mudar esse hábito se com os seus filhos funciona perfeitamente?
A questão é:
Temos de entender o uso da palavra "NÃO" em termos caninos (e quais as suas consequências) ao invés de humanizarmos as situações dos nossos amigos de 4 patas.

Ora vejamos, num breve exemplo pitoresco... 

O José e a Maria compraram/adoptaram um cão para lhes fazer companhia, esse cão ainda é cachorro pois querem acompanhar o seu crescimento e muito felizes vão buscá-lo e trazem-no para casa.
Chegam com o cão a casa, metem-no no chão da sala e e o cão começa a farejar e a andar de um lado para o outro... até aqui sem problemas, é apenas o cão a conhecer o seu novo espaço, mas entretanto, ele conhece a perna de uma linda mesa de madeira de carvalho na sala que lhe cativa o interesse, e depois de a cheirar começa a mordiscá-la... visto que, sendo um cachorro esta é a maneira de conhecer o seu meio ambiente.
Realmente, sendo cachorrinho não é muito diferente de um bébé humano de dois anos, porém, como não tem mãos usa a boca com mais frequência que uma criança de dois anos.

Quando os donos vêm o cachorrinho a morder a perna da mesa de madeira de carvalho, o José grita logo.. "Não! Pára com isso!"
O cachorrinho muito contente continua a mordiscar a mesa de madeira e finge não ter ouvido. O José reage repetindo essa ordem... "Não.. Nãol!"
O cachorrinho não presta a mínima atenção e continua a morder como se nada se tivesse passado.
O José já frustrado vai ter com o cachorrinho e afasta-o da mesa suavemente.. o cachorrinho não vai de modas, olha para o José, afasta-se uns passos e faz um belo xixi no tapete persa da sala que tinha sido caríssimo!
O José e a Maria gritam.. "Não!" em uníssono... pegam no cachorrinho e levam-no até ao seu quintal, onde o põem no chão enquanto dizem em voz severa.. "Cão mau, ficas aqui e não vais lá para dentro"

A situação é hipotética, mas infelizmente acontece. 
É algo que os donos simplesmente seguem por impulso sem terem noção das eventuais consequências que isso poderá ter futuramente. Será esta uma atitude dos donos correcta ou incorrecta?

Em termos de adestramento canino verificamos que estes dois donos estão a dar continuamente ordens ao seu novo cão e ele continuamente as ignorou, basta observar.
Ignorou-as justamente porque ninguém lhe ensinou que aquele comportamento era errado.
Nós (humanos) sabemos perfeitamente que o uso da palavra "NÃO" significa que um cão deve parar imediatamente aquilo que está a fazer, no entanto, na situação que eu relatei o cachorrinho ouviu a palavra "NÃO" quando estava a morder a perna da mesa pelo menos duas vezes sem que nada tenha sido feito posteriormente para corrigir essa situação.

Resultado final:
O cão vai aprender a ignorar a palavra "NÃO", principalmente se esta situação se repetir seis vezes por dia, durante um, dois ou três meses.

E claro, este casal fantástico ainda não aprendeu os conceitos de prevenção e redireccionamento. Isto é, ainda não aprenderam a ensinar ao seu cão aquilo que deveria roer, para depois o poderem elogiar quando ele rói as coisas que deve.
Ou seja, quando puseram o cachorrinho no chão da sala já deveriam ter brinquedos para morder destinados à sua exploração.
E mais importante, os cachorrinhos têm a bexiga extremamente pequena e não aguentam as suas necessidades, cabe a nós "donos" colocar o cachorrinho lá fora (ou no tapete de treino) e esperar até que ele  se alivie por completo e só posteriormente é que o levamos para dentro de casa ou de uma determinada divisão da nossa casa... após o cachorrinho ter-se aliviado, deveria ter sido elogiado por isso (e eventualmente premiado com um biscoito) para que o comportamento que acabou de fazer seja considerada uma experiência positiva e ele a repita sempre.

Então o que ensinaram José e Maria ao seu cachorrinho?

a) A não ouvir/ignorar a ordem "NÃO"
b) As pernas das mesas estão à disposição e são interessantes para mordiscar.
c) A sala é um sítio tão bom como os outros para fazer xixi, aliás, até tem um tapete persa fantástico!
d) O quintal pode ser um sítio bonito, porque é para aqui que as criaturas grandes me levam e depois começam a gritar.

Obviamente que o José e a Maria não queriam fazer nada disto, acabou por ser uma reacção completamente humana.
Como acontece com tantos  outros donos, não se aperceberam de que, se têm um cão, estão a treiná-lo desde o primeiro segundo.
O cenário acima descrito não ensinará este cão apenas de uma vez só, mas muitos donos repetem-no ou repetem cenas semelhantes centenas e centenas de vezes, antes de começarem um treino de adestramento "formal" adequado aos seus cães.
Muito mais se poderia dizer desta conotação negativa da palavra "NÃO", nomeadamente, porque no nosso dia-a-dia a utilizamos diversas vezes e ao condicionarmos essa palavra ao cão como forma de o corrigir poderemos cair no erro de o cão a associar a uma situação completamente errada. (Exemplo de discurso com outra pessoa que poderá fazer confusão ao cão: "NÃO vás por aí")
Eu pessoalmente, como adestrador canino, prefiro fazer um som... "Schhhhht!" ou um "Ai Ai", pois não existirá qualquer possibilidade remota do cão ser induzido em erro.


Se tiverem dúvidas acerca deste tema ou outros não hesitem em contactar a Passos Caninos! ;)

Saudações caninas,

André Moreiras
Passos Caninos

2 comentários:

  1. Bom trabalho André. É importante que esta mensagem seja passada para que a palavra "NÃO" seja banida do léxico do adestramento canino.

    Sílvio Pereira

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  2. Muito Obrigado Sílvio Pereira pelo comentário.
    Fico muito contente de saber que leu o meu artigo e gostou pois aprendo sempre muito consigo.

    Um grande abraço,

    André Moreiras
    Passos Caninos

    ResponderEliminar

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